Saturday, December 13, 2014


                                                             Os «Peidos» da Artista
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Tal como diz a letra do fado Recordações dum breve amor, os dois subiram por uma escada tosca de velhas tábuas; a cama negra e tão esburacada, e de alguns lençóis iguais, deixaram recordações dum breve amor. Mal ele pôs os pés no quarto, despiu-se e foi ao bidé lavar as partes de baixo (banho de puta), enrolou-se no lençol em forma de charuto e meteu o braço por debaixo da cabeça, pondo-se a contemplar a cantadeira com os olhos em bica. Ela foi a seguir. Despiu-se a temperatura rondava os 20º, lavou-se da forma que o companheiro fez. A voz dele cortou o silêncio.
─ Tomara muita rapariga nova ter o teu cabedal! ─ Ela envaideceu-se e pôs-se a cantarolar uma cantiga, deixando a água correr pela torneira do bidé. De súbito, os efeitos de gazes do champanhe acumulados na sua barriga, fizeram um estrondo no quarto: pum, pum, e logo a artista se descontrolou, atirando com semelhante peido cá para fora, que entoou pelo ar.
Padeiro saltou da cama aos berros:
─ Que grande badalhoca ─, tinha o rosto de uma escultura. ─ Isso não se faz a um homem. ─
Mamuda levantou-se, cambaleando, e percebeu que as lágrimas que lhe caiam pelos olhos tinham também desespero. No instante em que, ele já equipado com a roupa, revoltado, arrancava o passo para a saída, voltou-se para trás.
─ Ó mulher, tu nem digas nada, olha que azar o meu, vir aqui para gozar um pouco e levar com o peido da artista, essa é boa. ─
Abandonou o quarto às gargalhadas. Quem o visse, até diria que era maluco. 
                                                                       

                                                                                                                                 Abraão, em Escritos Traidores.

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