Em 1980, o
imobiliário P. da Costa foi levar uma mulher chamada Mónica, que conheceu pela
primeira vez, a ver um apartamento que esta pretendia alugar, na zona do
Carvalhido, no Porto. Quando estava a observar o apartamento, Mónica suspeitou
nitidamente das intenções de Costa e não tirava os olhos de cima dele. Três
anos mais tarde, Mónica, no seu comentário pessoal, revela: «Queria que eu
fosse a sua amantezinha — e queria que eu metesse a língua na sua boca. Sabia
que ele estava pronto por me saltar para cima...» A atitude de Costa a este
acanhamento simulado foi preparar-se para o assalto a ela, de calças em baixo.
Mónica ficou completamente arrasada, com as suas «maneiras bruscas» e gritou
para ele acabar com aquilo. Ele obedeceu prontamente. Na próxima vez, foi mais
cavalheiro. Levou-a a ver outro apartamento para alugar, mas mobilado e
recheado com todos os eletrodomésticos, na zona do bairro de Monsanto, no
Porto. E a relação há muito esperada aconteceu na cama. «O calor que parecia
ardente aumentava, tornava-se cada vez mais quente, e rapidamente puxou a
persiana acima, e o ar ficou mais respirável... A seguir, Costa deitou-se ao
meu lado, excitando-me com beijos ardentes e meigos nos ouvidos... e, de
repente, tentou convencer-me a praticar
— sexo anal — e, quando eu me recusei, ele disse-me: «Relaxa-te
amorzinho — todos os casais o experimentam». Depois senti uma dor aguda a
penetrar dentro de mim e no último segundo gritei, mas não parei o ritmo. A dor
cegou-me mais do que o calor do ambiente, e pedi-lhe num murmúrio que dissesse:
«Chama-me tua panelinha, chama-me! e entrei em loucura, como se estivesse em
êxtase, — e depois aceitei-o por completo.» Costa detestava preservativos e,
como resultado disso, a sua amantezinha-panelinha engravidou. Tinha de assumir
a paternidade ou então concordar ambos num aborto. Costa e Mónica tentaram
levar a coisa nas calmas, e Mónica foi fazer um teste que confirmou a sua
gravidez e que ia ter uma menina. A ideia de ter uma menina quase o ia levando
ao delírio, pois Costa era casado e pai de três meninos. Consta que Costa disse
aos amigos na festa de anos: «Bem rapazes, isto é melhor do que a lotaria, mas
ainda vamos ter que esperar.» Costa começou a passar a maior parte do tempo a
conviver com clientes da boémia, enquanto Mónica e as suas meninas tomavam
conta do bar. Dois meses depois, Mónica abortou e Costa desfez-se em lágrimas
de pranto. Os rumores começaram a circular de boca em boca; continha pormenores
das manobras de Mónica, incluindo o simulado da gravidez, e por fim, um bocado
de uma tripa de porco comprada no talho, como amostra de um possível feto de
criança. As bocas tiraram o maior partido destas revelações. Houve alguém que comentou:
«Mesmo os palermas, que gramavam o Costa há meia dúzia de meses, preparam-se
para fazer abrir as goelas para se rirem dele.» Um ano depois, enquanto Costa
se debatia com problemas intestinais, Mónica terminou a relação e proibiu-lhe a
entrada na sua casa.
As bocas dos
clientes habituais aproveitaram todas as oportunidades para incendiar os
tarados e viciados de O Mundo da Noite; continuaram a tirar partido dos casos
de P. da Costa, mesmo depois de este ter desaparecido do ambiente. Os patrões
de O Mundo da Noite achavam que teriam de fazer qualquer coisa urgentemente
para mudar a imagem da capital do prazer. Abraão foi na deixa e fundou um
pasquim semanal intitulado O Jornal Dos
Traidores, cuja primeira edição era aguardada com enorme frenesim e, Abraão, que era um ótimo contador de
histórias com mais de uma dezena de livros publicados sobre histórias de frequentadores
da noite, aproveitou o seu bom humor para fazer valer os seus dotes literários.
O seu objetivo principal, consistia muito simplesmente, em detetar desgraças
dos clientes e das mulheres da noite — as que eram tara-maníacas, as que eram
dependentes de comprimidos, as que partilhavam o homem com a amiga, e as que
eram histéricas ou lésbicas. O sucesso do pasquim foi tão grande que Abraão se
podia dar ao luxo de ter informadores por todo o lado a dar-lhe dicas para um
artigo para as colunas das fofoquices. As notícias chegavam às manadas. Abraão
depressa compreendeu que a maioria dos frequentadores preferiam saber das
bisbilhotices dos outros, ignorando as suas. E logo, uma das vítimas decidiu
contestar o jornal; depois de um artigo que se referia a umas brincadeiras de
vibrador numa banheira. Ana Cinzenta roubou O
Jornal Dos Traidores. Só havia
uma tiragem. Outras mulheres da noite seguiram-lhe o exemplo. Fifi fez um
escabeche e escondeu debaixo do sofá O
Jornal Dos Traidores por a ter acusado de pagar as despesas a um cliente da
noite. Dois meses depois, na
Residencial da Xangô, Albertinho das Flores, ameaçou O Jornal Dos Traidores por insinuar que tinha drogado uma
acompanhante para fazer amor com uma prostituta, jurando não mais voltar ao
bar. Foram tantos os clientes-traidores que apresentaram reclamações que Abraão
decidiu mudar de estratégia e deixar de publicar fotos das personagens. Depois
de Abraão se ter tornado o «rosto de O Mundo da Noite», foi escrevendo história
sobre história, a qual escrevia qualquer artigo capaz de provocar a fofoquice,
mesmo em casa alheia. Mas os casos escandalosos continuavam a aparecer. Abraão
dizia às suas prostitutas e colaboradoras que deviam limar a sua vida pessoal
de modo a que qualquer atitude «vergonhosa e suja» fosse evitada. Todavia, ele
mesmo era conhecido por se aproveitar de sua posição para ir para a cama com as
colaboradoras, enquanto as suas histórias malandras incluíam sempre um bacanal lordesco ou cenas que havia casais na
mesma cama.