Sunday, May 7, 2017


onde o avistou e chamou por ele. «Mãos-leves» veio ao seu encontro. «Aqui está o dinheiro que te devo, e o troco também», disse o padeiro Carlos, e deu-lhe com a saca dos cacetes nas fuças. Naqueles tempos, no Porto era vulgar haver extorsões e um homem que tivesse sido chantageado devido a um caso de proxenetismo suscitava a simpatia geral. O «mãos-leves» apregoou incapacidade física, indicando que Carlos lhe dera um bolo-rei como troco. Ambos deram o caso por encerrado.

Um amigo de Abraão, Rufino M, teve um pequeno papel importante, quando lhe apresentou duas quarentonas da vida fácil na sua residencial. A partir daqui, Abraão desenvolveu um sistema para chamar clientes ao bar, numa roda constante atrás de uns rabos de saias. O primeiro casal a sair para uma rápida, levou Abraão a entrar no balcão, a abrir os braços e a dizer «Até já, meus pombos. Espero que fiquem radiantes com o amor-instantâneo.» O amor-instantâneo era simplesmente um engate banal, ao qual homem e mulher conversavam o que tinham a conversar, e depois, seguiam para o cardenho de uma pensão. Mas quando o sistema foi lançado ao público em O Bar do Traidor, numa tarde de Fevereiro de 1983, o seu criador, Abraão sabia que tinha dado um passo importante no seu negócio. Comentou: «Sabia que os tinha apanhado quando vi os desejos nos olhos dos clientes do bar.» Abraão foi o primeiro a aproveitar na totalidade este sistema revolucionário num bar de estilo inglês e uma decoração rústica, com a monta envidraçada para a rua que deixava transparecer uma visibilidade pura, tal como os cafés parisienses. Hoje em dia achamo-lo normal, porque desde há uns anos, estamos familiarizados com a inovação e o modernismo. Abraão veio a Lisboa em 1982, a fim de fazer uma visita aos bares da capital e estudar os seus funcionamentos. Sabia que os seus métodos eram populares, porque rendiam dinheiro. Mas quando voltou para o Porto, trazia na bagagem um monte de ideias. Cada vez que lançava uma ideia era aplaudido e apreciado pelos clientes e amigos, e por um rancho de raparigas da rapidinha, que adoravam trabalhar no seu método. Foi devido a esse facto que a mulher da rapidinha se tornou como uma espécie de fruta apetecida, que o mais pequeno sopro do chega aqui podia-se transformar numa ida para o Muro dos Prazeres (residencial).


A primeira grande desgraça de O Bar do Traidor ocorreu em 1981, quando chegou a notícia de que a encantadora e atraente Profe — como ficou a ser tratada —, fugira da boémia e fora atrás de um homem casado dono de uma churrascaria, no Porto. (contava ela dezoito anos e ele trinta e oito anos). A sua história era a história clássica da aventura. Enquanto adolescente, tinha-se pirado de casa dos seus pais, e de uma infância infeliz, para ser estudante em horas vagas nos cafés. Depois recebeu um convite de um bar para fazer permanência como «chamariz perfeito» alternando e aceitou. A seguir, tornou-se uma das raparigas de Abraão, e mais tarde uma empregada de boite. Amantizou-se com outro patrão da hotelaria, Toni «Qualquer-Coisa», um homem pacato do tipo homem bom. Mas as relações entre ambos revelaram que Profe já não era a encantadora atraente que frequentava a boite. Profe chegara à noite antes do amante e os seus passeios incluíam bares de diversão mal frequentados, muita bebida juntamente com elementos do submundo portuense. As más bocas começaram a dizer coisas referindo que ela frequentava estes lugares na tentativa de apanhar bebedeiras para se manifestar e acabou por se viciar. Mais tarde ainda, as outras más bocas revelaram que ela própria tinha aderido à bebida e ao fumo antes de se amantizar com Toni. As más bocas da última hora anunciavam: «Profe, alcoólica». Os amigos da noite acreditavam que aquela relação não era duradoira — Profe e Toni «Qualquer-Coisa» tinham acabado de se separar para seguirem outros caminhos —, mas isto era esperado. Profe acabou por sobreviver à desgraça, mas mudou radicalmente a sua vida.