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Enquanto
eu me debatia com o balcão às moscas, vazio, sem ter uma alma viva, eis que a
chegada de Pipi da Tabela trouxe os rumores de uma história dos tempos da
carqueja do meu avô! E uns minutos depois, na presença de alguns clientes,
desafiei-o a contar uma história diferente por ele vivida em terras
estrangeiras. E começou… ─ Sou um imigrante no Luxemburgo. Quando lá cheguei
fiz de tudo um pouco até tomar conta de um café. Um dia tive a feliz sorte de
ver uma mulher da terra depositar nos contentores do lixo umas sacas que
atraíram o meu faro de imigrante. Depois dela desaparecer, fui vasculhar as
sacas e deparei com um conteúdo valioso que me fez despertar uma ideia genial ─
fez uma pausa para beber um ginger ale. ─
Levei o conteúdo das sacas para o café e pus o tacho no fogão a aquecer com um
pouco de azeite. Quando terminei, depositei o material em cima do balcão e
coloquei um cartaz que dizia assim: «VENDE-SE PIPIS.» E ele fez nova paragem
para saciar a sua sede. ─ Mais tarde, quando se constou na vila, as pessoas
apareciam aos magotes no café para provarem os tais «pipis». Faziam inchar as
bochechas como quem sopra num balão. E o negócio entre Março e Dezembro
transformou-se num autêntico negócio da China. Foi a minha melhor época até
eles descobrirem o meu preparo e aí acabou-se o negócio, os miúdos de frango
foram para o galheiro!...
Abraão,
em Escritos Traidores.
…
ÀS DEZ E CINQUENTA desta manhã dou comigo dentro de um bar
e depois de me sentar a uma mesa do canto ouço uma estação de rádio. Rádio
Instantâneo. Se aquilo que o locutor disse é mesmo a sério tenho que me
habilitar. Mesmo que para isso tenha que escutar a noite inteira. Lálálá… Lálálá… Desde os fados que adoro
os versos. Não há muitas letras que me façam confusão. O homem foi apanhado na
marmelada com a sua companheira junto ao mar por um peixe-piranha que saltou da
água e mordeu parte da gaita. Pobre coitado. E agora teve que ser socorrido nas
urgências hospitalares, para lhe fazerem um excerto de pele tirada dos tomates,
afim de encher a parte faltosa. Eu cá é que não gostava nada que me enfiasse na
minha ferramenta um bocado dos meus tomates. Mas o pobre coitado também não
tinha muito por onde escolher. Que raio de sorte. Há dias em que um homem não
deve sair de casa. Discuti o assunto comigo mesmo. A história da ferramenta era
um assunto muito grave e cauteloso. Não vale a pena estar aqui a explicar tudo
ao pormenor, penso eu. Para que é que deu ao peixe a maldita ideia de vir
apanhar ar fora de água, mas as técnicas da medicina remediaram a situação… E
mais à frente o locutor anunciou: ─
Não há marmelada p´ra ningém.
Abraão, em Escritos Traidores.