Saturday, March 30, 2019




    
                                        

                                 UMA NOITE DE COPOS
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   E numa noite fria de Fevereiro, Nicha disse:
   «Vou ter de voltar a trabalhar.» -
   Foi uma surpresa para mim. Num dos períodos controversos da sua vida, sentiu-se um pouco só e voltou aos palcos que tão bem conhecia noutros tempos. Neste caso, Nicha com a sua idade e o seu servilismo, era apenas uma mais valia à espera da hora, em lento tiquetaque.
   Nicha esperara pelo momento para contar a sua narrativa de entretenimento. Algo nervosa, levantou-se da cadeira, começando a contar a sua desgraça num desespero total. Aquela desventura com o colega de trabalho que conhecera no bar, apareceu a nu e deixou-a de rastos, conforme salientou através das suas palavras:
   ─ Acabei a minha ligação com esse homem. ─
   A cozinheira tentou confortá-la.
   ─ Ó mulher, ainda há dias estavas tão feliz com ele? ─
   Ela não esteve pelos ajustes. Cheia de fúria, atirou com a tigela da sopa para o chão.
   ─ Se sois minhas amigas, não me faleis mais desse cavalo. ─
   O silêncio tornou-se irrespirável. Menino Quim, o porteiro, tirou os óculos da cara, pondo-se a limpar calmamente as lentes, com o guardanapo de papel. Bilontra, a colega, tentou pôr água na fervura.
   ─ Tem paciência, sei muito bem o que é gostar desses bardamerdas que não nos merecem sequer uma unha do nosso pé. ─
   A cozinheira voltou a interferir.
   ─ Ontem, ri-me tanto, quando contaste que foste com ele beber um copo à discoteca, depois levou-te a casa, querias que ele subisse ao quarto mas ele não quis; às tantas, tiraste-lhe os sapatos e obrigaste-o a ir descalço para casa. ─
   Ouviram-se risadas.
   Repentinamente, Nicha bateu fortemente com a colher na mesa. Voltaram-se todos.
   ─ O cavalo não quis subir mas fiz com que fosse para casa sem sapatos, só para a mulher o ver descalço. ─
   Soltou uma valente gargalhada. O jantar havia terminado, olhei de esguelha para as garrafas de vinho sobre a mesa, estavam completamente vazias. Fez-me lembrar certo provérbio:
   «O homem bebe para embebedar-se ─ mas a mulher bebe para alegrar-se.» Cada um de nós voltou para a sala.
   Lá dentro, outra festa ia começar.