Monday, May 4, 2015




Nesta cidade tudo se resolve. És Chefe de mesa, rapaz. Não podes ter o aspecto da Padeira de Aljubarrota nem do Zé do Telhado. Esse belo salteador. Deve ser atraente ser-se assim, ter uma vida atribulada e terra em vez de miolos. Mas deve ter pensado que não nascera para ser mártir quando acabou deportado naquela província colonial, em Benguela, com os nativos correndo à volta das fogueiras, e as silvas esmagadas pelos mocassins dos seus pés, e sem mais nada que os conformasse além do trepidante e adorável som do batuque, e os seus próprios guerreiros a rebolarem-se uns contra os outros, com medo que as fogueiras se apagassem. O seu corpo estava indescritível, escrevem aqui em O Primeiro de Janeiro. E foi naquela terra de Angola, onde conheceu a sua hora fatal, a última e para sempre. Pobre salteador, pensou. O fim de todas as suas ilusões. É a única coisa boa que têm os salteadores. Nunca têm ilusões, excepto más ilusões.

                                                                                                                                                             O Chefe, em Os Rapazes da Noite.    




MANUEL DIAS, que foi considerado o melhor motorista de todos os condutores que por aí circulam nas estradas, nesses tempos, ele guiou desde bicicletas, motorizadas, furgonetas, camionetas de carga, tractores e carros de todas as cilindradas até chegar ao famoso R.R. (Rollys Royce.) E ainda guiou uma avioneta que sobrevoou Vila Nova de Gaia sem uma asa. Ele conta esse acidente com grande satisfação: Assim que vi a avioneta sem uma asa, pensei logo em safar-me e levei o aparelho para a zona do Cabedelo e fui perdendo altura até embater contra um pescador e, por coincidência, foi o pobre desgraçado que serviu de asa, acabando por equilibrar a avioneta e, assim, aterrei na areia sem danos maiores, a não ser o pescador, que fracturou meia dúzia de costelas e partiu a cabeça.


                                                                                                                                                        Extraído do livro, A Música Que Eu Dou.