Saturday, December 13, 2014


                                                      Uma Noite de Copos
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E numa noite fria de Fevereiro, Nicha, algo nervosa, levantou-se da cadeira, começando a contar a sua desgraça num desespero total. Aquela desventura com o colega de trabalho que conhecera no bar, apareceu a nu e deixou-a de rastos, conforme salientou através das suas palavras:
─ Acabei a minha ligação com esse homem. ─ A cozinheira tentou confortá-la. ─ Ó mulher, ainda há dias estavas tão feliz com ele? ─ Ela não esteve pelos ajustes. Cheia de fúria, atirou com a tigela da sopa para o chão.
─ Se sois minhas amigas, não me faleis mais desse cavalo. ─ O silêncio tornou-se irrespirável. Menino Quim tirou os óculos da cara, pondo-se a limpar calmamente as lentes, com o guardanapo de papel. Bilontra tentou pôr água na fervura.
─ Tem paciência, sei muito bem o que é gostar desses bardamerdas que não nos merecem sequer uma unha do nosso pé. ─ A cozinheira voltou a interferir. ─ Ontem, ri-me tanto, quando contaste que foste com ele beber um copo à discoteca, depois levou-te a casa, querias que ele subisse ao quarto mas ele não quis; às tantas, tiraste-lhe os sapatos e obrigaste-o a ir descalço para casa. ─ Ouviram-se risadas. Repentinamente, Nicha bateu fortemente com a colher na mesa. Voltaram-se todos.

─ O cavalo não quis subir mas fiz com que fosse para casa sem sapatos, só para a mulher o ver descalço. ─ Soltou uma valente gargalhada. O jantar havia terminado, olhei de esguelha para as garrafas de vinho sobre a mesa, estavam completamente vazias. Fez-me lembrar certo provérbio: «O homem bebe para embebedar-se ─ mas a mulher bebe para alegrar-se.» Cada um de nós voltou para a sala.

Lá dentro, outra festa ia começar.


                                                                               Abraão, em Escritos Traidores.

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