Uma Noite de Copos
_________
E
numa noite fria de Fevereiro, Nicha, algo nervosa, levantou-se da cadeira,
começando a contar a sua desgraça num desespero total. Aquela desventura com o
colega de trabalho que conhecera no bar, apareceu a nu e deixou-a de rastos,
conforme salientou através das suas palavras:
─
Acabei a minha ligação com esse homem. ─ A cozinheira tentou confortá-la. ─ Ó
mulher, ainda há dias estavas tão feliz com ele? ─ Ela não esteve pelos
ajustes. Cheia de fúria, atirou com a tigela da sopa para o chão.
─
Se sois minhas amigas, não me faleis mais desse cavalo. ─ O silêncio tornou-se
irrespirável. Menino Quim tirou os óculos da cara, pondo-se a limpar calmamente
as lentes, com o guardanapo de papel. Bilontra tentou pôr água na fervura.
─
Tem paciência, sei muito bem o que é gostar desses bardamerdas que não nos
merecem sequer uma unha do nosso pé. ─ A cozinheira voltou a interferir. ─
Ontem, ri-me tanto, quando contaste que foste com ele beber um copo à
discoteca, depois levou-te a casa, querias que ele subisse ao quarto mas ele
não quis; às tantas, tiraste-lhe os sapatos e obrigaste-o a ir descalço para
casa. ─ Ouviram-se risadas. Repentinamente, Nicha bateu fortemente com a colher
na mesa. Voltaram-se todos.
─
O cavalo não quis subir mas fiz com que fosse para casa sem sapatos, só para a
mulher o ver descalço. ─ Soltou uma valente gargalhada. O jantar havia
terminado, olhei de esguelha para as garrafas de vinho sobre a mesa, estavam
completamente vazias. Fez-me lembrar certo provérbio: «O homem bebe para
embebedar-se ─ mas a mulher bebe para alegrar-se.» Cada um de nós voltou para a
sala.
Lá
dentro, outra festa ia começar.
Abraão, em Escritos Traidores.
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