Sunday, June 5, 2016





                 FERNANDO ABRAÃO

                 O VELHO
                        E O SEXO

                        2008
                        ~~~
                                                                     PRÓLOGO


Um velho pintor amante de sexo
sem grande esforço, conquista uma esperta prostituta.
Antes de se aperceber na alhada em que se meteu,
terá de fazer face a uma rivalidade tenaz com
aqueles que a querem comer.
Da contenda pela prostituta e da briga com o  ambiente
que os rodeia
nasce uma grande amizade entre o pintor e a
prostituta.

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                        CAPÍTULO 1
      

1. CENA ___________________________________________________

EXT: RUA – DIA

Caminhando em passada curta,CONDE DO PINCEL murmura para dentro de si próprio:

“O nome que me deu mais notoriedade
é o meu apelido de traidor,
Conde do Pincel. Tenho 72 anos.
Minha relação com a vida…
       consiste em divertir-me com ela e em goza-la.
Foi por isso que me aproximei
por vontade própria
de toda a minha vida privada.

Isso tornou minha velhice romântica.
         Sempre adorei o sexo,e sou grato por isso.
Comecei a estudar
para me tornar independente…
e acabei amando a pintura.
Tenho a sorte de ter uma santa mulher.
Ainda me atura há muitos anos.

Talvez deva confessar
que sou um velho sentimental…
O que às vezes torna a vida alegre…
Tanto para mim quanto para
os que convivem comigo.”


2. CENA ___________________________________________________

EXT: RUA – DIA

No passeio, CONDE DO PINCEL encontra-se com VIGILANTE e começam a falar sobre assuntos boémios.


VIGILANTE
Gostava de o levar comigo à folia.
Apanhei bons rabos de saias.

CONDE DO PINCEL
Tem um faro apurado.
Continue com ele.

VIGILANTE
Recorda-se de quando passava
vários dias a conquistar tudo?
E agora, de repente,
conquistei eu boas ratas.
Todos os dias,
durante três semanas.

CONDE DO PINCEL
Lembro-me.
Não pensei que você tivesse ido...
porque duvidara...

VIGILANTE
Um amigo quis
que nós fossemos.
Não tem muito faro.

CONDE DO PINCEL
Mas nõs temos.
Não temos?

VIGILANTE
Sim.

3. CENA____________________________________________________

INT: BAR – DIA

Entram três raparigas que são encaminhadas para uma mesa junto à parede. São duas loiras e uma morena.

RATAZANA
Um sumo para aqui.
Um licor para ali
─ e uma coca-cola para acolá.
                                                      ─ Obrigada.

UMA LOIRA
Fizeram grande festa?

RATAZANA
Ah, sim. É a entrega dos dinheiros
 da caixa de 20 amigos. E o seu amigo, menina?

UMA LOIRA
Está à espera que eu lhe telefone
O tipo acha que sou empregada dele.

RATAZANA
Sente-se bem, aqui?

UMA LOIRA
Muito bem.
Não se preocupe se ele não
me telefonar.

RATAZANA
A maioria das loiras não tem paciência.

UMA LOIRA
Eu tenho calma de sobra.

RATAZANA
Ainda bem.


4. CENA ___________________________________________________

EXT: RUA – DIA

CONDE DO PINCEL e VIGILANTE aproximam-se da porta do bar. VIGILANTE deixa-se ficar para trás e pede um favor.

VIGILANTE
Pode-me oferecer um
uísque da sua garrafa
no bar?

CONDE DO PINCEL
Porque não?
             Entre amigos…(Olha para a miúda que sai do bar)


5. CENA ___________________________________________________

INT: BAR – DIA

As três raparigas falam entre si e olham para as mesas repletas de gente.

UMA LOIRA
Se calhar eu podia
ser membro da caixa.
Vocês esperavam aqui na mesa
cheias de frenesim
que eu distribuísse o guito.

MORENA
Era giro.

UMA LOIRA
Não acham a ideia divertida?

OUTRA LOIRA
Só a ideia,
não.
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6. CENA ___________________________________________________

INT: BAR – DIA

Entram CONDE DO PINCEL e VIGILANTE e dirigem-se para o balcão, olhando em seu redor.

VIGILANTE
Ratazana, um uísque
da garrafa do meu amigo!

      CONDE DO PINCEL(Saúda os presentes)
Olá, meus senhores.

Um cliente que faz parte de um grupo de três, estende a mão e fala alto.

  CLIENTE DA MESA
 Conde do Pincel!

CONDE DO PINCEL
Sim?

CLIENTE DA MESA
Não teve nega?

CONDE DO PINCEL
Não.

CLIENTE DA MESA
Há quantos minutos andava atrás da miúda,
meu amigo?

CONDE DO PINCEL
Minutos, não.
Segundos.

CLIENTE DA MESA
Este é um pesadelo
 para nós.
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AMIGO DO LADO
    É um dos melhores clientes de sexo.

CLIENTE DA MESA
           A sorte dele é que paga como um lorde.
Não tardará a influenciar as nossas gajas.

7. CENA ___________________________________________________

VIGILANTE apela a CONDE DO PINCEL.

VIGILANTE
Quer que lhe arranje um esquema
para coçar o umbigo?

CONDE DO PINCEL
Já tenho quem me coce.

VIGILANTE
Gostava de lhe poder agradar
de qualquer jeito.

CONDE DO PINCEL
Fez-me um pouco de companhia.
Já é um amigo.
8. CENA ___________________________________________________

INT: BAR – DIA

As três raparigas olham para CONDE DO PINCEL e VIGILANTE.

OUTRA LOIRA(Toca no braço da Morena)
Achas que são...
                     ...pai e filho?

MORENA
Sei lá.
A curiosa és tu.
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9. CENA ___________________________________________________

VIGILANTE entusiasma CONDE DO PINCEL numa aposta.

VIGILANTE
Sei como conseguir
os dois esquemas
para hoje à noite.

CONDE DO PINCEL
Não.
Hoje estou um
bocado cansado.

VIGILANTE
Deixe que eu arranje
os dois esquemas
para a gente farrar.

CONDE DO PINCEL
Um, chega.

VIGILANTE
Dois?
                         ─ Está bem, dois.

CONDE DO PINCEL
Está a fazer bluff?
Talvez esteja...
                                                       Vamos a ver.

10. CENA __________________________________________________

O CLIENTE DA MESA do grupo de três amigos começa a querer sair da mesa.

CLIENTE DA MESA
Vou falar com ele.

AMIGO DO LADO
Não, deixa-o em paz.
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       CLIENTE DA MESA(Levanta-se da mesa)
Desculpe, Conde do Pincel.
     Como passa?(Estende-lhe a mão)

   CONDE DO PINCEL(Regeita)
Bem.

CLIENTE DA MESA
Todos sabemos que é perito em mulheres.

CONDE DO PINCEL
Não.

CLIENTE DA MESA
Sim.
Eu e os meus amigos queremos saber
porque razão a Sophia Loren...
... não fez nenhum filme
últimamente.

CONDE DO PINCEL
Está inactiva.
Teve uma paragem
na carreira.

             CLIENTE DA MESA(Volta-se prós amigos)
Estão a ver?
Eu sabia que havia alguma coisa.
Agora já sei
porque é que ela parece
uma velha cansada.

CONDE DO PINCEL
Engana-se.
Mesmo inactiva, a Loren
é sempre bela.
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CLIENTE DA MESA
Se tu o dizes...
Mas eu penso, corrige-me
se me engano, Conde do Pincel...
Mas penso que ela já deu o que tinha a dar.
É que a sua fama supera a sua arte, sim.
Mas isso não é pouco usual.
Dizem que você...
Foi campeão de sexo do grupo de atiradores
do Bar do Traidor.
Desde Janeiro a Dezembro
do ano de 2006.

CONDE DO PINCEL
Diz-se, está dito.

CLIENTE DA MESA
Mas eu não acredito nisso.

AMIGO DO LADO
Vamos embora, Morcela.
Sim, vamos.
Vamos beber mais uma cerveja.
Um momento, por favor!

CLIENTE DA MESA
Estou a falar com o Conde do Pincel.
O campeão-da-truca-truca.
Ele diz que foi um grande campeão e,
... gostava de ter o prazer
de o ver deitar abaixo uma daquelas beldades
ali da mesa da parede.

AMIGO DO LADO
És um insolente, Morcela.

CLIENTE DA MESA
Que dizes, velhadas? Atreves-te?
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          CONDE DO PINCEL(Fixa o olhar dele)
Sim.
Fica a ver.
      O dono será o apresentador.(Volta-se para o dono)
Leve-me àquela mesa.

CLIENTE DA MESA
Boa sorte, velhadas.

CONDE DO PINCEL pousa o copo de uisque em cima do balcão e segue o dono pela sala. Depois, inicia-se as apresentações junto das raparigas e segue-se o diálogo.

CLIENTE DA MESA(Aproxima-se)
Desculpem! Esperem um momento.
Estava enganado.
     Olhem para esta figura.(Volta-se para trás)
Não é a figura de um campeão.
É apenas um esqueleto de um humano
velho e atiradiço.
  Será capaz de se escaqueirar
como se fosse um castelo de areia.

CONDE DO PINCEL
Tens letra.

 CLIENTE DA MESA
Desculpe, Conde do Pincel.
Estava mal informado.
Ratazana,
não faça conta.
Não nos destabilizes
com o teu preço alto, velhadas.
Não nos destabilizes.Saiem)

VIGILANTE
  Teria dado cabo dele.
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CONDE DO PINCEL
      Hoje, não estou em forma.(Volta pró balcão)
        Amanhã, será...(Olha prás garrafas)
um grande dia.

VIGILANTE
Onde vai?

CONDE DO PINCEL
Não muito longe.

VIGILANTE
Não seja guloso. Uma para si chega e
duas dá para mim.

CONDE DO PINCEL
Existe uma delas...
que me está esperando.

VIGILANTE
Eu estou no meu trabalho
a fazer o meu serviço.
Assim, se sobrar algo para mim,
poderei ajudá-lo.

CONDE DO PINCEL
Você gosta de ajudar-me muito…

VIGILANTE
Você sabe que sim.
E tenho-lhe indicado
onde ir, como sabe.
Ainda quer ir sózinho?

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CONDE DO PINCEL
Sim.

VIGILANTE
Tem força para ratar
uma gaja boa?

CONDE DO PINCEL
Acho que sim.
   Além disso faço truques.

VIGILANTE
Tem sono?

CONDE DO PINCEL
Um pouco;
e você?

VIGILANTE
Eu não.
Vom fazer uma vigía.

CONDE DO PINCEL
Agora, vou sentar-me no sofá.
Vou ver o filme.
Sabe quem mo emprestou?
O Ratazana.
Vou excitar-me com as mamas da Sophia Loren.

VIGILANTE
Vou ver as putas.
Depois conte-me o filme.
Adeus,
até amanhã.

CONDE DO PINCEL
Até amanhã.
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11. CENA __________________________________________________

INT: BOATE – NOITE

VIGILANTE dirige-se ao balcão e deita uma mirada à sala.

VIGILANTE
Olá Luís,
quero umas águas sem gás.

LUÍS
Estás farto de olhar as raparigas, Vigilante.
Temos…
morenas, loiras, portuguesas,
brasileiras, ucranianas.

VIGILANTE
Dá-me de beber.

LUÍS
Queres escolher uma?
Não, não.
E duas?

VIGILANTE
Duas mulheres juntas.
Quanto é que é?

LUÍS
Meto tudo na conta.

VIGILANTE
Não.

LUÍS
És um mau negociante,
Vigilante.
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12. CENA___________________________________________________

INT. APARTAMENTO DE CONDE DO PINCEL – NOITE

CONDE DO PINCEL entra sorrateiro em casa mas a mulher está à sua espera.

MULHER
Já é tão tarde.
Onde estiveste?

CONDE DO PINCEL
Por aí…
A ver as modas na noite.

MULHER
Já vi.
O teu retrato não
está onde devia estar.

CONDE DO PINCEL
Deixei-o em cima da cómoda.
Assim olho menos para ele.
Fez-me sentir mais velho.

MULHER
Anda para a cama.

CONDE DO PINCEL
Deixa-me estar um pouco aqui.

MULHER
Não te vens deitar?

CONDE DO PINCEL
Vou já.

MULHER
Não demores muito.
Tá-bem.

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