Saturday, March 24, 2012

CONTOS DE RATAZANA
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10. Episódio
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Eis como os amigos embebedaram uma rapariga e, depois, aproveitaram uns mimos calorosos


Roque, o primo de Pipocas, era um sonhador a dar ao romantismo. Tentava saborear a conquista, procurava acalentar a sedução, compartilhava o prazer. Um Roque durão ou em pensamentos do diabo era coisa que não existia. O seu coração estava aberto para quem dele quisesse fazer uso. O seu expediente e o seu saber estavam à disposição de todos aqueles que, nesses moldes, fossem menos espertos que ele. Foi ele quem levou a melhor sobre Miss Zara durante a ida ao bar quando ela traiu o primo Pipocas. Quando a enfermeira Sandra perdeu a chama do seu coração, a sua rica chama que lhe dava todos os prazeres do corpo, foi Roque quem lhe perdeu o rasto, armou a confusão e pôs ela contra o primo. Foi Roque quem, uma vez, sacou a amante a António Caço onde ela se encontrava a atacar na sua própria casa, e um tal ato exigia não só um coração aventureiro como também um estômago tenaz. Juntamente com esta capacidade de seduzir bem, Roque tinha o dom de dar com situações em que a prática de um episódio burlesco era necessário. A sua fama era tal que uma vez Catanada disse: «Se o Roque tivesse ido para pastor, Marco de Canaveses teria dado um terreno para um curral.»

Era hábito de Roque ir todos os dias para o refeitório do pessoal da fábrica de confeções onde trabalhava porque em primeiro lugar, podia espalhar aí a sua veia conquistadora e, em segundo lugar, porque do canto da coluna do prédio em que se colocava podia ver as pernas de um grande número de raparigas. E não era nenhum crime. Roque gostava de olhar para as pernas das raparigas. Um dia, depois de ter saído do trabalho, Roque presenciou uma cena caricata. Um empregado de café enxotara de dentro do estabelecimento, um rapazola de dezoito anos, que por sua vez, trazia atrás de si uma rapariga de idade parecida com uma saia curta. O empregado de café ia dizendo:

— Quero lá saber que não vás com a minha cara. Não podes é ficar aqui sentado na cadeira a tarde toda, com a rapariga sem fazer despesa. Andai lá para a rua.

O rapazola protestou num tom de revolta.

— Mas, calma camareiro, nós não estávamos a estorvar. Porque és assim tão ranhoso?

O empregado de café reparou em Roque.

— Eh, conterrâneo — chamou. — Que é que este azeitona está a querer levar?

Roque adiantou-se e dirigiu-se ao rapazola.

— Posso ser-te útil nalguma coisa?

Um rode palavras brotou do atrevido rapazola.

— Vim à procura de um gringo. Uns conhecidos disseram-me que aqui é que ele parava, mas não o encontrei. Estava sentado mais a rapariga à espera e este músico veio ter comigo a insinuar coisas e pôs-se cá fora.

Roque acenou com a cabeça e voltou-se para o empregado do café.

— Este amigalhaço partiu alguma loiça?
— Não, mas está quase há duas horas a ocupar uma mesa, e a rapariga atira-se aos clientes.
— É um conhecido meu — retorquiu Roque. — Eu desenrasco a eles.
— Está bem, mas não os traga para aqui.

Roque e os seus novos amigos subiram a rua.

— Vou levar-te aí a uma cabana onde param uns amigos para tratarem do teu caso. É a tua namorada?
— É a minha rapariga — respondeu o rapazola. — Sou azeitona, e a rapariga é minha. Agora está a treinar, mas quando for boa há-de ser rainha.

Olhou o corpo da rapariga. Na verdade a rapariga parecia estar ainda verde. A vontade de Roque duplicou.

— A cabana onde vamos é um local onde estacionam uns amigos da corda. O maioral chama-se Pipocas. É um individuo de que uma rapariga se pode erguer quando está em dificuldades. Vamos lá, que Pipocas dá-vos apoio. A Senhora do Porto, que é minha amiga, tem uns senhores de bem. Pedimos-lhes uma ajuda para a rapariga.

Pela primeira vez surgiu na cara do rapazola um sorriso de alívio.

— Isso são boas notícias — disse ele. — De onde eu venho, tenho eu muitas pessoas que eram capazes de me dar este mundo e o outro só para eu os deixar ter um consolo com a rapariga. — Gabou-se um tanto a Roque: — Tenho conhecidos donos de casas de passe, mas, claro, só sabem explorar as raparigas.

Roque empurrou a porta da cabana e entraram todos de uma assentada. Pipocas, Pascácio e Very nice estavam sentados em redor da mesa, fazendo as moscas voar. Roque empurrou o par para dentro da cabana.

— Está aqui um jovem mãos-leves, um azeitona — apresentou-os. — Trás uma rapariga com ele e a rapariga está a treinar nas lides.

Os amigos levantaram-se com rapidez e olharam para o corpo da rapariga.

— Está mesmo a treinar — disse Pipocas. — Era talvez melhor a gente levá-la para o Porto.

O rapazola, porém, rejeitou a ideia redondamente.

— Para o Porto, não. Não gosto do Porto. A rapariga não quer nem se rala muito. Depois de treinar talvez fique mais alegre.

Nesse momento, entrou Catanada e observou a rapariga.

— Esta rapariga está triste.

Catanada, então, meteu mãos à obra. Mandou Very nice ao mercado pedir uma garrafa de uísque fiada e uma caixa de doce sortido. Disse a Pascácio e a Artur Bófia para arranjarem café e porem a grafonola a dar música. O Pipocas ofereceu uma pastilha elástica à rapariga que aceitou. O rapazola, de pé no meio da cabana, sorria de satisfação para aqueles bons rapazes. Por fim, a rapariga foi posta no sofá e foi-lhe dado cigarros e café à rapariga e, logo no seu olhar, apareceu uma expressão de alegria e repetiu o café. O Faísca entrou, trazendo um saco de amendoins. Os amigos tiraram as cascas e comeram os amendoins. A rapariga só queria beber uísque e comer amendoins. Depois de comerem e beberem sentaram-se em volta da mesa, dispostos a cavaquear um pouco. A música tocava ramaldeiras. De vez em quando um dos amigos levantava-se e ia treinar a rapariga. O rapazola estava calado a ouvir. Os amigos estavam um pouco apreensivos com a sua atitude, pois queriam saber coisas a seu respeito. Catanada, para quem o saber era tão fundamental como descobrir uma mina de ouro, tentou algumas vezes desmantelar as escusas do rapazola.

— Raras vezes se vê um jovem mãos-leves com uma jovem no bota-abaixodisse ele num tom baixo para a rapariga não ouvir.

O rapazola sorriu, vaidoso. Pascácio continuou:

— Esta rapariga foi provavelmente encontrada no albergue de menores. E é com certeza o melhor local, pois aí só há raparigas boas.

O rapazola aproveitou a oportunidade para fugir à conversa, ao mesmo tempo que exprimia a sua gratidão.

— Vocês têm sido amigos para mim. Têm sido tão amigos que eu não contava com isso. Nem eu, nem a minha rapariga.
— E onde é que está a família dela? — perguntou Pascácio.

O rapazola ficou sério.

— Na França — respondeu. Depois, recuperando a esperteza, continuou: —Conheci um velhote que me contou uma história curiosa. Disse que a gente pode fazer das raparigas aquilo que a gente quiser. Disse-me ele: «Diz muitas vezes à rapariga o que tu quiseres que ela seja que, quando ela se mentalizar, faz isso que lhe disseste.» Não me fartei de dizer a esta: «há-des ser uma rainha.» Vocês acham que ela chegará a ser rainha?

Delicadamente, os amigos acenaram com a cabeça em sinal de concordância.

— É capaz — disse Catanada. — Eu nunca ouvi falar nesse uso.
— Eu digo uma quantidade de vezes ao dia: «Maria, um dia há-des chegar a rainha. Há-des ter grandes escoltas, um castelo e uma coroa de ouro. Há-des viajar num jacto privado e ter um pénis dourado. Que loucura, Maria.» O velhote disse que a rapariga tinha de ser mesmo rainha se fosse isso que eu lhe dissesse.

Pipocas levantou-se e aproximou-se da rapariga no sofá.

— Há-des ser rainha — disse à rapariga. — Se fores meiguinha, serás a rainha de todos nós.

O Faísca foi atrás dele, e murmurou:

— Há-des ser rainha — e perguntou a si próprio se aquela forma teria efeito no cão.

Voltaram a conversar.

— A família dela está em França... — sugeriu Catanada.

O rapazola franziu o sobrolho e manteve-se calado durante um momento; depois, sorriu com excesso.

— Vou contar-vos isto. Isto, são coisas que só se contam aos amigos. Eu era copeiro em Campanhã e como era aplicado e mexido tinha as raparigas sempre em cima de mim, fui promovido para a sala. Depois enrolei com uma bela rapariga. Não digo que não foi por causa das minhas bocas que ela se meteu comigo. Mas era bonita e chavalita e tinha uns olhos azuis, belos peitos para fora e uns dentes brancos e perfeitos. De modo que em breve nasceu este projecto.
— Boa — antecipou o Pipocas, de volta à sala. — Gostava de estar no teu lugar. Não há nada tão bom como ter uma rapariga a trabalhar para nós.
— Pois não — disse o rapazola. — Eu fiquei todo a ferver. No dia da estreia no motel, levei uma bolsa agarrada à cintura, para meter o dinheiro. Quando saímos do motel, um chulão, com gajas foleiras e um casebre pequeno viu a minha rapariga. Não demorou muito que ela me fugisse. Então, fui ter com o chulão e disse-lhe: «Devolve-me a minha rapariga?», e ele respondeu: «Tu não dás valor à rapariga para falares desse modo com quem sabe mais do que tu.»

O rapazola levantou os ombros num gesto de resignação.

— Ah, o sacana! — exclamou o Very nice.
— Arranjastes uns amigos e lixaste esse chulão — interpôs Pascácio.

O rapazola ficou à rasca.

— Não. Não tinha por onde lhe chegar. Na primeira noite, alguém se atirou contra mim no quarto de banho. Na segunda noite, uma garrafa voou para mim que os gritos atiraram comigo para o chão. De modo que me pus ao largo e trouxe a rapariga comigo.

O rosto dos amigos tinham uma expressão de intensidade e os seus olhos brilhavam ansiosos. Lá dentro, o Faísca soltou um berro e logo o cão rosnou.

— Nós é que gostaríamos de ter assistido a essa cena! — exclamou Catanada. — Havíamos de ver como é que o chulão se desmedrava da situação. Um fiscal fez sofrer o meu avô e ele, então, prendeu-o, nu, a uma árvore, regou-o com leite e soltou uma matilha de gatos esfomeados para fora. Oh, pá, há sempre maneiras!
— Eu era um simples novato — retorquiu o rapazola. — Tive de cavar. — Laivos de revolta rolaram-lhe dos olhos. — Quando um chulão se mete contra um novato, pouco há que lhe possa valer. De modo que cavei e trouxe a Maria comigo. Em Campanhã encontrei esse velhote sábio que me disse que eu podia fazer da Maria o que eu quisesse. Digo à rapariga quantidade de vezes por dia: «Há-des ser uma rainha. Há-des ter escoltas e uma coroa de ouro.»

Olharam para o rapazola com estupefação. Era tão jovem para ter tido uma aventura daquelas!

— Se a gente estivesse agora em Campanhã — disse o Pipocas, caloroso. — Catanada fazia um plano da situação.
— É realmente pena. Mas um dia a gente vai lá ir.

Artur Bófia tinha-se mantido à distância, matutando sobre a fascinante história do rapazola. Aproximou-se do sofá e espreitou.

— Há-des ser rainha — disse. E momentos depois: — Eh! A rapariga está com uma moca monumental.

Os amigos cercaram o sofá. O álcool já tinha feito efeito. A rapariga estava de pernas abertas uma para cada lado e o corpo meio desnudado. Os olhos, vidrados, olhavam, esgazeados, pra um e pra outro. A rapariga rebolava-se constantemente e sorria.

— Sais de frutos! — gritou o Pipocas. — É preciso uns sais de frutos.

Mas ele, e os outros sabiam o que havia de fazer. Aqui estava uma situação que exigia a ação dos amigos. A bebedeira que se apanha usa uma cara que a ninguém engana. Enquanto observavam, a rapariga endireitou-se e pediu de beber. Catanada chegou-lhe uma tigela com água que rapidamente deslizou pela garganta abaixo. A boca ficou de novo seca. Estava mocada. Amável, o Pipocas cobriu as costas dela com um pequeno cobertor. O rapazola, muito firme, olhava fixamente para a rapariga, tão chocado que não podia falar sequer. Very nice pôs-lhe a mão no ombro e levou-o para uma cadeira.

— És novo — disse. — Há-des prepará-la melhor.

O rapazola lamentou-se.

— Está embriagada. Não a devia ter deixado beber. Assim, nunca será rainha; nem nunca terá um castelo e uma coroa de ouro.

Havia pena nos olhos dos amigos. No canto, o cão olhava atentamente. O Faísca coçou com a mão no pelo do Vigília. Num tom calmo, quase uma explicação, Catanada disse.

— Agora, tu mesmo tens de a avisar a não beber. Cumprimos o teu pedido do treino; esse treino já foi dado; agora, tens de ser tu a preparar um esquema de treino, nós ajudar-te-emos, se quiseres.

O rapazola encarou Catanada com uma expressão indiferente.

— Treino? — perguntou. — É o que você quer dizer?
— É fácil ver qual é a tua ideia — retorquiu Catanada. — A rapariga evolui e chegará a rainha; a seu tempo, explora o chulão e suga-o lentamente. É uma boa ideia. Uma longa jornada e depois finito. Uma tal ideia torna-te merecedor da nossa estima.

O rapazola olhou perplexo para Catanada.

— Que é que está para aí a dizer? — perguntou. — Eu não tenho nada a ver com esse chulão. Um chulão é sempre um chulão.

Os amigos chegaram-se ao pé deles. Catanada exclamou:

— Então, que vem a ser isso de quereres fazer da rapariga rainha?

O rapazola ficou um pouco atrapalhado.

— O homem tem o dever de querer o melhor para a sua rapariga. Eu quero que a Maria tenha mais coisas boas do que aquelas que eu sonhei.
— E que mais? — interrogou o Pipocas.
— Bem — respondeu o rapazote —, a minha rapariga é uma chavalita, mas não é nenhuma puta. É uma boa chavalita e o chulão cobiçou-ma. O chulão tem umas gajas foleiras e um casebre pequeno e a freguesia é só de rasca baixa. Agora, topem-me, — continuou ele, entrelaçando as mãos —, se o chulão com gajas foleiras e um casebre pequeno quis sacar-me a rapariga, o que é que uma rainha com um castelo grande e uma coroa de ouro não pode sacar.

Criou-se um clima silencioso, enquanto o Pipocas, Catanada, Pascácio, Very nice, o Faísca, Artur Bófia e Roque punham o raciocínio a funcionar. Depois de terem raciocinado, esperaram que o Pipocas falasse.

— É bonito — disse por fim o Pipocas — saber que tão poucos homens se preocupam com o bem-estar das raparigas. Agora desejamos mais do que nunca que a rapariga tenha sucesso, pois com um homem assim, que feliz futuro não será o dela.

Todos os amigos, olharam uns para os outros, concordaram com a cabeça.

E agora que é que pensas fazer? — perguntou Very nice, o pensador.
— Vou para França — respondeu o rapazola. — No fundo, sou um mãos-leves, como vocês dizem. Pode ser que, se eu continuar a pôr ideias na rapariga, ela chegue um dia a rainha. Quem sabe?

Os sete amigos olharam-no com admiração. Estavam radiantes de terem conhecido um rapazola assim.

Wednesday, March 7, 2012


CONTOS DE RATAZANA
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9. Episódio
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Eis como o Pipocas foi atraído por uma mulher e como os amigos o ajudaram


Manuela Miss Zara vivia no fundo de uma rua sem saída, perto da autoestrada Porto-Devesas, numa casa independente destinada ao negócio de pensão. Explorava há tempos o negócio e vivia com um colega do mesmo ofício. Não era bonita esta rapariga de corpo pequeno, mas na sua silhueta havia uma certa voluptuosidade de movimentos; o seu olhar possuía um certo tom sedutor que alguns homens consideravam arrebatador. As suas formas eram capazes de fazer destapar quaisquer olhar por mais insípido que fosse com uma paixão adormecida que aqueles homens, para quem as curvas físicas são importantes, achavam atrativa e sedutora em extremo. Nos seus momentos ríspidos nada tinha de apetecível, mas dentro dela produzia-se uma ligação amorosa com frequente facilidade para lhe chamarem a boa Miss Zara da autoestrada Porto-Devesas.

Dava gosto vê-la nos momentos em que nela o instinto animal manifestava o seu faro de caçador. Como se arreava em cima do banco do bar! Como gracejava num semiadormecimento feliz! Como balanceava suavemente as ancas num constante vaivém! Quem melhor que ela era capaz de pronunciar de tanta malícia coberta as palavras: «Ei, gordinho. A onde vais?» É verdade que, geralmente, a sua voz era arrastada, o rosto macio e liso como uma peninha, o seu aspeto leve e os seus desejos egoístas. Só uma ou duas vezes por semana e, em geral, ao início da tarde, o seu eu mais brando vinha ao de cima. Quando Miss Zara soube da herança do Pipocas ficou feliz por ele. Sonhou andar com ele, como todas as mulheres do Porto ao Marco de Canaveses. Ao iniciar a tarde, sentava-se no banco do bar à espera que o Pipocas entrasse e caísse na ratoeira. Durante bastantes semanas a sua armadilha nada apanhou a não ser alguns pobres coitados e empregadores que não eram senhores de negócios nenhuns e cujas falas tinham, algumas vezes, fugido de melhores escolas.

Miss Zara não estava contente. O seu negócio estava num impasse, numa situação que ela não sabia como dar a volta por cima. Miss Zara não era mulher de se encolher. Era uma destemida, e a sua conduta não tinha limites para atingir os seus fins. Se o Pipocas parasse, se falassem como novos amigos que eram, se ele entrasse para beber um copo de uísque, então, a sua arte feminina demasiado forte, não teria grandes obstáculos de ser bem- sucedida. Mas abandonar a teia montada junto ao banco do bar, isso era inimaginável. Durante várias semanas, muitas tardes a fio, ela esperou em vão, aceitando aquelas bebidas que uns tantos andores falavam consigo. Era corrente que, mais dia, menos dia, o Pipocas entrasse no bar e parasse em frente do banco de Miss Zara; e, de facto parou. Durante o período em que eles se tinham conhecido, nunca houvera uma altura em que a paragem de Pipocas trouxesse mais vantagens a Miss Zara. Na verdade, o Pipocas tinha trazido nessa manhã uma encomenda de medalhas e pulseiras que a Central de Fiéis e Peregrinos encomendara. Pipocas tirou as medalhas do armário e meteu-as numa caixa. Depois, pediu ao Faísca que desse uma volta com o carrito pelo quarteirão e que reparasse se via algum forasteiro pelas redondezas, e levou a encomenda à Central de Fiéis e Peregrinos, onde vendeu a mercadoria por vinte contos. A caixa deu-a ao Faísca.

— Podes guardar tralhas aí dentro — disse.

O Faísca ficou muito agradecido. O Pipocas, com os vinte contos no bolso, deu uma fugida ao centro e dirigiu-se com rapidez precisa ao Bar do Traidor. Manuela pôs na voz a entoação docemente melada de um zumbido de mosca.

Ei gordinho. A onde vais?

Pipocas parou. Nos seus planos deu-se uma reviravolta.

— Como estás, Miss Zara?
— Que é que isso te diz? Nunca te interessaste em saber — respondeu ela com malandrice, ao mesmo tempo que fazia balancear as ancas num movimento rodado e gracioso.
— Que queres dizer com isso? — perguntou ele.
— Bom, és meu amigo e nunca alguma vez vieste visitar-me à pensão? — Estou aqui agora — retorquiu Pipocas, charmoso.

Manuela chegou-se um pouco mais para ele.

— Não queres mandar vir um sumito para a menina em nome da nossa amizade?

O Pipocas mandou.

— Que tens andado a fazer por aí? — perguntou ela.

Então o Pipocas cometeu um gafe. Orgulhou-se da venda que fizera e gabou-se de ter vinte contos no bolso.

— Anda ali fora só para te dizer uma coisa — disse ela.

Sentaram-se no carro dela e trocaram uns mimos doces. Momentos depois, Pipocas apalpou as partes sensíveis de Manuela. Com grande estupefação sua, encontrou nela uma resistência verdadeiramente despassarada para o seu estilo e temperamento. A veia dominadora do prazer despertou nele. Irritou-se. Só quando ela queria ir embora começou a ver as coisas mais claras. A voz melada disse:

— Não queres ir hoje visitar-me, Pipocas? — os olhos de Miss Zara navegavam numa nuvem de suave convite. — Aqui há mil olhos — sugeriu ela, atentamente.

Pipocas compreendeu.

— Conta comigo — prometeu.

A tarde ia avançando. Pipocas meteu-se no carro e pôs-se de novo a caminho do Marco de Canaveses. Dentro dele o instinto sexual modificara-se, e transformara-se num enorme pato romântico.

«Vou levar um presente àquela simpática morena», disse de si para si.

No fim da viagem, quem havia de encontrar senão o Pascácio? Este deu-lhe uma das suas pastilhas elásticas que tinha a mais e pôs-se a andar a seu lado.

— Aonde vais?
— Não é altura para fainas — disse o Pipocas com mau humor. — Em primeiro lugar vou beber um caneco para pôr a cabeça em ordem. Podes vir comigo e tomar um copo, mais que um é que não. Estou farto de dar uísque aos meus amigos e serem eles que o mamam todo.

Pascácio concordou que não se podia medir todos pela mesma tutela. Pelo que lhe dizia respeito, não queria o caneco do Pipocas, mas sim a sua companhia. Foram para o café Central. Beberam um copo de uísque de uma garrafa que Pipocas comprara há dias. Pipocas confessou que dar um copo a um amigo era uma coisa, mas a quatro e cinco era outra. Bebeu outro, a despeito dos visados protestos de Pascácio. «As mulheres», pensou Pipocas, «não devem fazer muito sexo. Ficam logo com tendência para se fazerem apaixonadas.» Falaram mais umas coisas. Uma conversa a meio gás era um tema para descodificar alguma coisa, mas o tempo passava rápido. Deixaram ficar uísque depois do meio da garrafa e beberam o que restava nos copos. Em seguida, Pipocas mandou levar a garrafa para dentro.

— Gostava que viesses comigo à loja. Vou buscar um presente para oferecer a uma senhora casada — disse.

Puseram-se a caminho da loja seguindo num passo andante e firme. A loja do Pipocas situava-se ao centro da artéria principal. O compartimento não era grande, mas o seu espaço arrumava todos os artigos devidamente catalogados. Dentro das vitrinas havia medalhas, pulseiras, relógios, e artigos de prata e moedas de ouro; todos os artigos eram em primeira mão e estavam cobertos com o certificado de garantia. Pipocas aproximou-se de uma estante e tirou uma pulseira prateada, pô-la sobre o pulso para ver o tamanho e guardou-a no bolso. E, quando estava tudo em ordem, o Pipocas saiu da loja levando consigo o presente. Muitas vezes, ao fim da tarde, como mostrador, Miss Zara levava a pulseira no pulso e punha-se a mirá-la. Enquanto os seus clientes observavam, ela empurrava a pulseira para a frente e rodava o braço, a fim de mostrar como ela era valiosa. Ao mesmo tempo, com a voz, imitava o zumbido do vento.

— O amigo que ma deu é rico — disse. — Acho que já não falta muito para ele se declarar e depois é chiça, chiça e pronto!, aí está a menina a dar um pulo.

Os amigos tentavam diminuir o presente, dizendo:

— É pena que não tenhas mais amigos a entrar... eu sempre fui da opinião de que uma mulher astuta e um homem rico, amigos como deve ser, ainda são a melhor solução.

Mas o apetite deles nada podia contra a pulseira. A posse do negócio fez Miss Zara ascender ao topo da escada social. As pessoas que não se recordavam do nome dela referiam-se-lhe como «aquela que tem a quinta ao meio das pernas». Muitas vezes, quando os seus vizinhos passavam em frente da pensão, viam-na através do terraço, rolando a pulseira no braço, ao mesmo tempo que da garganta lhe saia umas ruidosas risadas. Despertou a inveja em muitas casas. As suas maneiras tornaram-se provocantes e atrevidas, e passou a andar de cara erguida como convinha a uma pessoa que possuía um negócio. Quando conversava com alguém falava sempre nele. «Quando o Pipocas esteve cá esta manhã, nem reparou que eu andava com a pulseira.»

O seu progresso, contudo, não a fez esquecer-se do Pipocas. Quando ele se encontrava na Invicta, Pipocas passava muitas tardes na pensão de Miss Zara. A princípio, os seus amigos ignoravam a sua comparência aos locais do costume, pois todos os homens têm direito a pequenas aventuras amorosas. Mas, como os dias passassem e uma vida caseira bastante flutuante começasse a tornar Pipocas fechado e esbranquiçado, os seus amigos ficaram convencidos de que a amizade de Miss Zara pela pulseira não era de todo a acautelar os bons interesses físicos do Pipocas. Tinham inveja de uma relação que há muito tempo lhes prendia o interesse. Durante a ausência de Pipocas, Catanada, Pascácio e Very nice, cada um por seu lado, atacaram o arquivo dos seus argumentos. Miss Zara, porém, ainda que se tivesse mostrado sensível à conversa, manteve-se fiel ao homem que ajudara a sua condição a um nível tão harmonioso. Procurou conservar a amizade que eles lhe ofereciam para uma necessidade futura, pois sabia quanto a sorte é inconstante, mas recusou redondamente quaisquer veleidades por parte deles que, por enquanto, dedicava ao Pipocas. Por tal facto os amigos, revoltosos, organizaram uma campanha dedicada ao bota-abaixo a Miss Zara. É possível que o Pipocas bem no fundo de si mesmo, começasse a ficar saturado da afeição de Miss Zara e da longa distância que isso lhe obrigava. Mas se tal situação se estava a operar, recusava-se a aceitá-la.

Viajava Pipocas ao volante da sua viatura, quando repentinamente, o telemóvel tocou triimm, tirou o telemóvel do bolso do casaco e atendeu a chamada. «Quem fala?» Ouviu-se uma voz melodiosa. «Não conhece a voz da sua princesa da anilha?» O seu coração bateu apressadamente. «Como é que me descobristes?» Soou uma gargalhada do lado da linha. «Meu palerma, sou eu ao telefone.» Foi a vez de ele soltar uma gargalhada. «Que estúpido que sou, a culpa é da tua voz que me excita.» Soou outra gargalhada. «Então, porque não mudas de direção e vens ter aqui com a tua princesinha?» Fez uma travagem forçada e desviou a rota, seguindo por outra estrada a galgar mais velocidade no carro. «Já vou a caminho», sussurrou baixinho, desligando o telemóvel. Pouco tempo depois, deixou-se enrolar nos braços da princesinha em pleno exercício de relaxe. No final do primeiro encaixe, pegou num cigarro para acalmar o nervosismo que sentia por dentro. «Estás nervoso?» Ela chamou-lhe a atenção, encostando a sua cabeça ao peito dele.

Pipocas, respondeu.

«Todas as vezes que olho para aquela porta, tremo todo só de pensar que o teu homem possa estar por aí a chegar.» Ela fez-lhe uma meiguice. «Não sejas medricas, a esta hora o meu homem está a trabalhar.» Poisou o cigarro no cinzeiro e atirou-se de novo para cima dele. Subitamente, a porta foi violentamente estroncada a pontapé. O homem que tinha arrombado a porta estava ali à frente deles, com um olhar ameaçador. Olhou firmemente para a mulher que procurava esconder o rosto. «Que bonito serviço este?» Depois, voltou-se para ele. «Nada tenho contra si, mas saia daqui que isto não lhe pertence.» Deu um salto da cama e deitou mão à roupa, balbuciando. «Desculpe, não sabia, se soub...» O homem não o deixou acabar a frase. «Ponha-se daqui a andar, antes que perca as estribeiras.» Saiu a correr desenfreadamente com a roupa na mão, a tempo de ouvir os gritos lancinantes que saiam pelo quarto fora. Pipocas vestiu-se conforme pôde e enfiou-se para dentro do carro. Ligando de imediato a agnição do motor, pôs-se ao fresco com a velocidade do raio. O suor escorria-lhe pelas faces. De olhos semicerrados, conduziu o carro velozmente pela estrada, murmurando amiúdes vezes: «Não volto a meter-me noutra, ai não, não...»

Uma tarde, eram duas horas, Catanada, Pascácio e Very nice, seguidos à distância por Artur Bófia, regressaram, sorridentes, de meia tarde de um dia de uma viagem fatigante. A sua campanha entrara em ação e agora, como quatro caçadores, regressavam da pesca mais contentes porque a jogada estava garantida. Catanada levava uma garrafa de uísque embrulhada num jornal da terra. Entraram alegremente em casa do Pipocas e Catanada pôs a garrafa em cima da mesa. Pipocas, arrancado a uma boa merenda, sorriu calmamente, limpou a boca a um guardanapo, foi buscar as tigelas e vazou o uísque. Os seus quatro amigos fizeram-se às cadeiras, pois o dia tinha sido desgastante. Beberam com toda a calma do mundo. Era a hora da descompressão, esse delicioso intervalo do dia. Ao fim da tarde há muitas coisas para se dizer.

— A Xanana Maluca arranjou outra confusão esta manhã — disse Pascácio. — Chama-se Calote; é careca. A Xanana diz, que o careca numa semana só lhe apareceu em casa duas noites. Ela não gostou e pôs-lhe as tralhas no meio da rua.
— A Xanana é uma mulher que muda de rumo como o vento — observou Pipocas.
— O irmão dela era pior — disse Pascácio. — Era incapaz de salvar alguém. Uma vez disse-me boa noite. Contei isso a Xanana mas ela nem se acreditou.
— Tem os dois a mesma panca. Tal irmão tal irmã — citou Catanada, virtuoso.

Pipocas vazou de novo o uísque para as tigelas. A garrafa levou um tombo. Catanada olhou para o Pipocas e disse calmamente.

— Vi a Sandra, a enfermeira, Pipocas. Disse-me que ainda não te esqueceu. Já deitou abaixo três vezes o teu primo Roque. Nas duas primeiras vezes que lhe deu o redondinho, ele sentiu-se mal e ela teve que lhe dar duas aspirinas. Mas agora disse-me que, quando quiseres, te dá tudo.
— Que é isso de redondinho? — quis saber Pascácio.

Catanada tornou-se reservado.

— Não posso dizer-te tudo. Deve ter sido o veneno de Ratazana que põe nome a tudo que o baralhou, acho eu — disse.

O uísque estava quase a desaparecer da garrafa. Era tão intensa a conversa que cada um dos seus amigos sentia que falar lhes causava mais sede. Catanada baixou os olhos ao chão e olhou para os amigos. A conspiração estava a chegar. Catanada tossiu para afinar a voz.

— Que é que te aconteceu, Pipocas, para toda a terra falar de ti?

Pipocas pareceu ficar irrequieto.

— Que estás para aí a dizer?

Catanada deu uma breve risada.

— Diz-se que te meteste com uma mulher casada e na altura do pirablo, o homem arrebentou a porta à patada. E safaste-te de levar uma valente coça. Há quem diga que a cena tem realmente piada.

Pipocas ficou ainda menos sossegado.

— Essa senhora gosta de cena — disse, desculpando-se.
— Por que razão não havia de gostar? Ela até disse a uns amigos que tu te puseste a correr com as roupas na mão e nem sabias onde tinhas estacionado o carro.

O Pipocas parecia cada vez mais nervoso.

— Ela disse mesmo isso?
— Foi o que me contaram.
— Não ponho lá mais as patas — exclamou o Pipocas.
— Se eu não tivesse achado piada, teria ficado chateado por ver que estavam a fazer pouco de um amigo meu — observou Pascácio.
— Que é que tu dizes quando ela te pedir para lá ires visitá-la? — quis saber Very nice.
— Digo-lhe que acabou — respondeu o Pipocas.

Catanada riu-se.

— Quem me dera ver essa cena. Não é assim de pé para a mão que se diz «não» a essa senhora.

O Pipocas sentiu que os amigos estavam conta ele.

— Que é que eu deva dizer? — perguntou, descontrolado.

Catanada encarou o problema com a sua espontaneidade natural e recorreu ao seu realismo para resolver o assunto.

— Se essa senhora não tivesse apanhado o teu jeito não quereria cena — disse.

Os amigos concordaram com a cabeça.

— Portanto — continuou Catanada —, o que há a fazer é tirar-lhe a cena.
— Ela não deixará que eu me afaste — protestou o Pipocas.
— Nesse caso, nós ajudamos-te — retorquiu Catanada. — Eu levo-lhe o teu primo Roque para a conhecer e tu, pagas-nos a despesa no bar, ele oferece à senhora um champanhe. Ela nem há-de fazer ideia com que malta do Marco se meteu.
— É capaz de alguma das raparigas o conhecer?
— Não, não conhece — prosseguiu Catanada. — Fica aqui. Eu vou levar o Roque.

Pipocas suspirou aliviado ao ver que o seu caso estava nas boas mãos dos amigos. Poucas coisas se passavam no Marco de Canaveses que não chegassem ao conhecimento de Catanada. Sabia que todos os dias, à hora do almoço, Roque ia almoçar. Contava com esta rotina quase invariável para pôr em ação o seu plano.

— É melhor que saibas tudo a respeito deste caso — disse a Roque.

Tinha na rua o carro já preparado. Contou o dinheiro para as despesas e meteram-se a caminho. Ao entrar no Bar do Traidor viu que Miss Zara não estava lá, mas como tinham de esperar, colocou-se a beber ao balcão, enquanto Roque foi para a sala beber a fim de presenciar a chegada dela.

«É mesmo azar se ela não aparecer», pensou Catanada.

Quando ia a pagar a despesa reparou em Miss Zara a entrar e puxou delicadamente o banco para ela se sentar.

— Esperei para estar um bocado contigo — disse.
— Porque é que não ficas?
— Não posso. Tenho que estar no Marco de Canaveses. Já vou atrasado.
— Como vai o teu amigo Pipocas?
— Não sei. Não tenho estado com ele há muito tempo.
— Passa por cá noutra ocasião.

Catanada não ouviu mais nada enquanto saia do bar de mansinho.

«Ela é capaz de ir na cara dele», pensou.

Metade do problema estava resolvido, mas faltava a parte final. Levou um tempo a esperar no carro, até ver sair Miss Zara acompanhada por Roque, a caminho da residencial.

«Que é que o Pipocas vai dizer a esta rameira?», perguntou Catanada a si mesmo. «Se volta a meter-se com ela, Miss Zara saberá que foi ele que empurrou o primo para o bota-abaixo. Poderei dizer que fui eu? Não, porque não me interessa a mulher. O que há a fazer é abster-me e ver no que é que isto dá.»

Agora o problema estava totalmente solucionado. Catanada recolheu Roque e seguiu direto ao Marco de Canaveses. A viagem foi rápida e veloz. Quando Catanada deixou Roque no centro, desceu de novo a rua, levava uma garrafa de champanhe no casaco. Foi recebido em banho-maria pelos amigos. Pôs a garrafa de champanhe em cima da mesa e sentou-se na cadeira. Juntaram-se todos, cheio de alegria, pois a sede que sentiam era como uma fornalha a arder. Quando a primeira taça foi sugada, Catanada encheu a segunda e ergueu a taça numa atitude de imperador.

— As coisas que acontecem valem o que valem — disse —, mas de tudo quanto acontece há sempre algo a aprender. Com isto, quero dizer, aprendemos que uma foda, especialmente quando se dá a uma mulher comprometida, não ser de modo a exigir uma outra foda. Apreendemos, também, que é uma loucura dar fodas demasiado boas porque podem causar maluquice.

A garrafa de champanhe já ia abaixo de meia. Os amigos olharam para o Pipocas a fim de ver se ele dizia qualquer coisa. Tinha estado muito calado, mas agora compreendia que os seus amigos aguardavam uma palavra sua.

— Era uma mulher com muito saber — disse, sensato. — Tinha um toque de cama acima da média. Mas raios levem isto tudo, estou cheio!

Pegou na segunda taça e embutiu. O Faísca, sentado na ponta com o cão, riu-se e murmurou com admiração.

— Raios levem isto tudo; estou cheio! — Achava estas frases fantásticas.

Ainda não tinham acabado com a garrafa de champanhe e só tinham contado duas anedotas quando alguém entrou. Era o primo Roque.

— Estive na residencial com a Miss Zara — disse. — A mulher está fula. Ficou por lá aos gritos e a atirar tudo para o chão.

Os amigos levantaram os olhos rapidamente curiosos. Alguma coisa se passou. Se calhar Miss Zara merecia-o. Tem feito trinta por uma linha e a sua vez chegara.

— Que é que aconteceu à Miss Zara? — perguntou Pascácio.

Roque aceitou uma taça de champanhe.

— Diz que vendeu o corpo para fazer um frete e que, ao apalpar-me o pulso, viu que tinha cometido um gaffe. De modo que pensou para dentro e achou que foi Catanada quem tramou a traição. Diz que vai quilhar o Catanada.

Catanada pareceu ficar surpreendido.

— Eu não sabia que ela ia deitar-te abaixo. Mas não disse eu que a Miss Zara merecia o que lhe fizeram? O que ela fez não é nada comparado com aquilo que nós lhe fizemos.

Pipocas sentia o calor da sua gratidão por Catanada. Bebeu um pouco e notou-se um esgar no rosto.

— Acho que — disse o Pipocas — vou comprar melhor champanhe para a gente ficar mais satisfeitos.