Wednesday, June 24, 2009

CONTOS DE RATAZANA










 FLIRT ENTRE ACALORADOS
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Clientes! Dois. Lima-Limão, a quem não via desde  aquele dia, em que na mesa dele, lhe apresentei uma destas estudantes de algibeira, e uma gaja. Ou uma tal. Pousam as mãos delicadamente no tampo de vidro da mesa e conversam animadamente do romance, ou dos estudos, ou de qualquer coisa interessante na hora. Ela é Sandra. Virgem, de alcunha traidora. Mas isso já foi à um bom par de anos. Ouve-se o seu petulante «Oferece-me um Baileys?», e fica-se com a sensação de se estar na presença de alguém que sabe encarnar o espírito camareiro. Sandra, confidencia Lima-Limão, é parecidíssima à sua segunda prima, que vive no interior. A confidência parece puramente formal e julgo que o encontro tem um fim meramente sexual. Mas Lima-Limão prossegue e diz-me que Sandra vai acabar o curso de enfermagem no Porto mas, como só tem aulas da parte de manhã, tenciona passar uns tempos no bar, para conhecer o ambiente. Um tipo tem de ser bem discreto, até mesmo para uma gaja que usa maxi-saia e sapatos rasos. Faço-lhes perguntas bem simples, com a mesma simplicidade com que daqui a uma hora já terei esquecido tudo o que disse. E quando é que acabas o curso? Os olhos dela chispam quando se vira para mim.



«Isso não é um dos meus problemas», diz. «Lima-Limão pensou que talvez aqui no bar eu pudesse arranjar mais inspiração.» Olha para o bar com os olhos, como se não o tivesse visto alguma vez.
… «Continua com um aspecto mais refinado… e é bem frequentado, claro?»
«Oh, sim», garante-lhe Lima-Limão. «Ratazana, encarrega-se de olear bem as coisas, não é verdade?»

Ela é que o vai olear até esticar o raio da língua! Mas não há mais nada a dizer… Vejo-a levantar para ir ao quarto de banho. De qualquer forma, tem uma cara divertida e há quem diga que é uma felina na cama. Mas que porra de cliente me saiu o Lima-Limão! Gostava de a poder ver de mini saia… Quando estiver inspirada, diz Sandra, não me posso esquecer de cá vir, pois o bar pode ser um local muito interessante, para uma rapariga que está sozinha… Clientes diurnos… Menino do Coro, como que ressuscitado, e passado uns minutos, Caseiro. Menino do Coro mostra-se encorajado em relação à nossa miss do ano de há umas semanas atrás. Diverte-se acerca disso, mas o seu divertimento transparece um certo arrojo. É extremamente lúcido acerca do que lhe aconteceu depois de ter a ter levado ao colo para ela colocar a boneca do concurso na parte de cima do balcão. Não lhe cortei a corrente. Assim que chega Caseiro, Menino do Coro bebe um gole de água e desaparece.

Desta vez não me lembro de o ter visto sair.

Caseiro arrasa-me com as suas queixas. Está decidido a não pagar copos e afastar-se de ir para a cama com Roca e Tesa. Esgotamento, considera ele. Senta-se na cadeira e pede-me o periódico, enquanto resmunga os nomes de algumas traidoras que no fundo são todas iguais. Talvez haja uma diferente… quem sabe?... Até ele pode acabar por descobrir uma, confidencia-me.

«Mas será necessário ir ao Mercado do Bolhão à procura de galinha gorda por pouco dinheiro?» quer saber. «Vou ter mesmo de esperar, não?»

Na verdade, acho que não, mas é-me evidente o que ele deseja ouvir. Digo-lhe, como se fosse a minha opinião, que provavelmente ele acabará por encontrar uma saloia sem vícios. Caseiro arrefece, com a frescura da cerveja, e dá um ligeiro abanão. Se elas se virassem para os clientes da chapa barata, diz, tudo se comporia muito melhor. Mas os outros parecem exercer uma má influência sobre elas. E Tesa… é de longe pior do que Roca, agora que já foi com ele para a cama. Aparece na sala, a exibir a ousada tatuagem a roçar a direcção do traseiro e não há forma de lhe escapar…

«Nem sei como me vou ver livre disto», diz. Faz um intervalo, olha-me de soslaio, e rapidamente afasta os olhos. «A última queca deu-lhe tamanha fúria, que me ia mandando pró maneta… Digo-lhe mais, nunca dei outra igual. Ela atormentou-me para que eu… me viesse duas vezes uma a seguir à outra enquanto ela mudou de posição…» Bebe um gole de cerveja num sôfrego. «A loucura foi… mas você entende. Ela sugou-me o leite todo e ferrou-me no cu. Ainda tenho a marca.»

Nem uma palavra, é claro, se troca mais acerca delas. Esta pequena paragem é desviada para que eu possa atender uma fila de clientes que entram juntamente… uma Sandra baixa e redonda, a dirigir-se apressadamente para a mesa de Caseiro. Ele levanta o olhar e aperta-lhe as mãos enquanto ela se senta. Começa a acariciar-lhe os dedos e a murmurar-lhe palavras tentadoras. Ela não pensou nada disso! Absolutamente nada! Foram-se mimando, a ela e a ele, com aquele pequeno aquecimento… o raio da estudante sabe até onde deve ir, penso eu. Caseiro levanta-lhe os cabelos até cima e puxa-lhe a ponta do nariz para baixo. Que olhos ela tem! Podia fulminar uma data de soldados agrupados na trincheira de uma batalha e nunca descobrir quantos tinha lá; podiam partir silenciosamente desta para melhor sem se doerem muito. Caseiro passa-lhe a mão pelos pêlos do braço e eles começam a ficar tesos. Os seus dedos esticam-se para a frente e os olhos dela saltam para fora. Enquanto se entretêm nas cócegas um com o outro, vai aumentando o rol de pestaninhas à sua volta olhando pasmados aquele par de amorosos. À medida que vai ficando mais aquecida, ela olha mais fixamente. Segundo penso, Caseiro agora julga que fazer mimos o torna mais atractivo… e a coisa começa a tornar-se um hábito. Sinto-me contente por tê-los juntado, mas gosto de os ver por cá…

Consigo matutar, pergunta-me ele, porque é que Sandra gosta tanto que lhe mexa nos pêlos? E eu faço-o de uma forma levezinha. Não a consigo magoar. Se não fosse por isso, talvez ela não me passasse bola. E enquanto me conta estas coisas, ela vai-se refrescar para o quarto de banho. É uma treta, acho eu, ele está à espera que ela baixe a parada e lhe faça o mesmo pagamento que Roca e Tesa lhe fazem, mas deixa-a à-vontade. Enfia uma pinga de cerveja entre as goelas, coçando a cabeça escabelada com os dedos. Passa uma vista de olhos pelas mesas e o olhar trespassa-me. Sandra volta de novo à sala e coloca-se no seu lugar onde através dos espelhos pelos quatros cantos tem curiosidade de ver quem entra e quem sai. Está tão em pulgas que não quer perder tempo a pegar nos livros para estudar. Diz a Caseiro que não a monta se não abrir mão de mais umas lecas… Não chegam a acordo.

Sandra conta-lhe coisas… Sim, ela até sabe que o seu prato fraco é uns mimos na cabecinha júnior… e quer fazê-lo de uma maneira diferente que Roca e Tesa dizem que o fazem. Ela quer que ele lhe coce tudo… tudo até aqueles pintelhos que cercam a caverna do Satanás. Olha-o com um suspiro e assim que ficam os dois silenciosos, faço-lhes chegar uns pires com amendoins e retiro-me para o meu posto. Momentos depois, ela mete-lhe um amendoim na boca, obrigando-a a mastigar. Acompanha o gesto com alguns piropos escolhidos. Produz uns sons desgastantes quando, através de uma folha de amendoim Caseiro se engasga e quase se asfixia quando tenta cuspir a folha para o cinzeiro ao mesmo tempo que a tem na boca. Sandra é malandra demais para que ele faça farinha dela, como fez com a Roca e Tesa, mas não consegue empurrá-la para a cama, onde não a convence com o seu finca-pé.

Todo o tempo que tinha livre, o meio da tarde quase indo, se está a escoar. Até a sua santa pachorra Caseiro vê fugir quando, repentinamente, lhe enfia a peta que quer ser seu amigo, e ser amigo é para sempre. Com duas petas bem enfiadas, ela está perfeitamente «adormecida», mas o que ela pensa ele não sabe, e eu duvido que ela embarque nessa. Não levanta os pés do chão quando ele abana os ombros como quem diz «mexe-te». Faz-lhe mesmo muitos mimos, sem quaisquer restrições. Mas quando ela diz para aumentar os valores e colocar dois novos dígitos ao estipulado… ah! Isso é o fim! Não posso aceder a isso, mesmo que os outros o tenham feito, começa a tentar dizer-lhe mas ela desvia os olhos para a assistência. Merda, não há como elas torrarem, que já não conseguimos levá-las, assim deve pensar Caseiro. Ainda não passaram dois segundos e já sente a careca quente e começa a passar-lhe a mão por cima. Tem de lhe explicar o joguinho que Tesa impôs, que é satisfazê-lo com pratos deliciosos, como se de um amante se tratasse. Isso anima-a… aperta os lábios com uma força medonha… se alguém lhe tentasse beijar, muito provavelmente partia os copos, atirava as cadeiras ao ar, só de boca fechada. Ela deve saber qual o modo como o deve apanhar, mas espera o momento, por isso obriga-o a gastar todos os trunfos. Por fim aperta o pescoço, como se ainda não tivesse bebido nada. Não secarei, sugere ela, oferece-me um licor como eu gosto? Oh, isso nem se pergunta, aceita. Tinha-se esquecido, enquanto decorria a conversa, mas agora ela fê-lo recordar-se… de como uma conversa a dois, só se compartilha bebendo em conjunto… Oh! Oh! Ela não deixa passar nada, aquela estudante. E finalmente consegue que ele admita o facto.

Bem – com certa pachorra – Caseiro talvez pense o facto que uma vez não são vezes… seria difícil apanhá-la depois. Sim, é possível que não a veja tão cedo. Coça-lhe a mama. Como é, vai ou não vai? Pergunta-lhe ela. Estamos combinados, não? Bem… VAI! Sim, julgo que também queiras ir. Levanta-se logo atrás dela. Ela bate-lhe a porta da sala, caminha, afastando-se o mais possível e baixa a cabeça enquanto atravessa a rua para a residencial. Desta vez levantou os pés do chão, ao contrário do que fez quando lhe disse pela primeira vez para subir a parada… nisso assemelha-se muitos às outras. Agora está à espera que ele cumpra o que tem a cumprir.

«Já conversou tudo», digo-lhe eu. Mostra-se manhoso. Atrevo-me a mandar uma boca daquelas! É costume levar a corda até ao fim. É isto que me diz o cozinheiro… que é costume!

Que seja costume, então. Vá lá comê-la porque me dá lucro e ela também ganha. Só para ele não se esquecer, ponho a conta em cima do balcão. Imediatamente, ele volta-se para mim.

«Tanto dinheiro!» É tudo o que diz e é o suficiente para eu provocá-lo, dizendo que ela quando se está a vir… chora que nem um bebé. Caseiro positivamente solta um riso alongado quando escuta a última frase. Não sei se ele acreditou, mas para mim dá-me um gozo tremendo pô-lo a rir. Ponho o dinheiro na caixa e fico a vê-lo partir, até que a porta se feche e um novo cliente faz desaparecer o antigo…